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A revolução da Inteligência Artificial (IA) na saúde já começou

Inteligência Artificial na saúde

Por Maristone Gomes


Entender e encontrar padrões em uma grande quantidade de dados é a principal habilidade dos sistemas de inteligência artificial atuais. Essa capacidade aplicada aos cuidados e à gestão de saúde tem o potencial de revolucionar como prestamos atendimentos médicos à população. O futuro dos tratamentos e da administração de centros de saúde potencializados pela inteligência das máquinas já está batendo à nossa porta. E as possibilidades são fantásticas.

Há algumas semanas, publiquei aqui um texto sobre inteligência artificial. Se você ainda não leu o artigo anterior, recomendo que dê uma olhada nele. Continuando a conversa, hoje vamos discutir sobre como essa tecnologia se aplica à saúde.

Os primórdios da inteligência artificial na saúde

Inteligência Artificial (IA) é o ramo da ciência da computação que se propõe a elaborar dispositivos que simulem a capacidade humana de raciocinar, perceber, tomar decisões e resolver problemas. O termo vem sendo usado desde os anos 1950, quando as primeiras programações desse tipo começaram a ser realizadas, em contexto acadêmico.

Muito rapidamente, as novas tecnologias de resolução de problemas por inteligência de máquinas começou a ser aplicada à saúde. Já nos primórdios da IA, havia pesquisas sobre como utilizá-la em tratamentos médicos e as primeiras soluções vieram ainda nos anos 1960 e 1970 com os sistemas Dendral e o MYCIN.

O Dendral foi um dos primeiros programas chamados de inteligência artificial com uso específico para a saúde. Criado na Universidade de Stanford, nos EUA, a ferramenta fazia análises químicas por meio de interpretação de dados espectrográficos, ou registros dos espectros luminosos, das substâncias. Com essas informações, o Dendral “deduzia” a estrutura molecular das amostras.  

Já o MYCIN, foi um sistema também dotado de inteligência artificial criado em 1972 para o tratamento de infecções do sangue. A proposta era que o programa tentaria diagnosticar pacientes com base nos sintomas relatados e resultados de testes médicos. A ferramenta era habilitada com 500 regras, o que hoje em dia não parece muita coisa, mas era revolucionário para a época. 

As aplicações de IA na saúde seguiram evoluindo nas décadas de 1980 e 1990, acompanhando o desenvolvimento da própria computação.

A popularização da inteligência artificial 

Em 1997, a inteligência artificial finalmente começou a ficar mais conhecida do grande público. O marco para essa mudança foi o desafio de xadrez entre o supercampeão humano Gary Kasparov e o programa de computador “pensante” Deep Blue, desenvolvido pela IBM. A dupla disputou duas séries de seis jogos. A primeira, em 1996, foi vencida por Kasparov. A segunda, no ano seguinte, foi conquistada pelo Deep Blue.

A derrota do enxadrista foi notícia no mundo todo. Era uma forma muito clara de mostrar a pessoas leigas um pouco do potencial da inteligência artificial. Se uma máquina pode vencer um humano em um jogo de raciocínio, o que mais ela pode fazer? 

A poderosa combinação entre inteligência artificial e big data 

O caso super popular do Deep Blue é um bom exemplo para explicar como a inteligência artificial funciona. Em resumo, podemos dizer que a vitória do computador foi “roubada”.

O segredo vencedor do computador da IBM lá no anos 90 era o seguinte: sua memória havia sido alimentada com vários jogos e estratégias adotadas pelos melhores jogadores de xadrez no mundo. Assim, durante as partidas contra Kasparov, tudo o que Deep Blue fazia era acessar os arquivos internos e escolher entre as muitas jogadas gravadas em seus circuitos. De certa forma, o jogador humano estava competindo contra vários enxadristas ao mesmo tempo, e contra uma máquina capaz de ler e escolher o melhor movimento dentre os tantos que esses profissionais já haviam usado em suas carreiras.

Inteligência artificial é isso mesmo. A máquina não está raciocinando da mesma forma que costumamos falar sobre o pensamento humano. A grande vantagem da IA está na capacidade imensa que esses programas têm de analisar grandes quantidades de dados e encontrar padrões neles. Esse potencial é muito maior do que a mente humana é capaz.

E essa capacidade de analisar dados ficou ainda mais relevante com o advento do que chamamos de Big Data. Resumidamente, Big Data é a possibilidade de captar, reunir e interpretar grandes volumes de dados variados e não-estruturados. O termo foi cunhado ainda nos anos 90, mas o grande crescimento da tecnologia de coleta de informação veio nos anos 2000 e até mais recentemente, com o estabelecimento da internet e, agora, com a popularização dos aparelhos móveis como celulares e wearables.

Utilizar sistemas para analisar grande quantidades de dados e encontrar padrões tem se mostrado um caminho sem volta para revolucionar a saúde.

Elementar, meu caro Watson (IBM Health)

Em 2007, a IBM apresentou ao mundo o Watson. Chamado na época de “super computador”, o sistema é, na verdade, um programa criado para entender a fala natural das pessoas e responder questões complexas compreendendo contextos e aprendendo com as interações. Assim como o Deep Blue, Watson ficou famoso ao ganhar de humanos em um programa de perguntas e respostas da tv norte-americana, em 2011. 

De lá pra cá, o sistema evoluiu e hoje tem várias aplicações voltadas para tomada de decisão e análise de dados, comercializadas para empresas. Outro passo da maturidade da ferramenta, veio em 2011 com as primeiras utilizações voltadas para a saúde. A capacidade de gerar hipóteses e de aprender sozinho de Watson foi usada inicialmente para o diagnóstico de câncer de pulmão, sendo expandida, com o tempo, para outras especialidades. O Watson Health foi estabelecido depois de alguns anos, para aglomerar todas as soluções de inteligência artificial para a saúde da IBM.

O sistema batizado com o nome do médico das histórias de Sherlock Holmes não é nenhuma unanimidade. A solução já recebeu várias críticas ao longo de sua história e, repetidas vezes, a reclamação é sobre a empresa prometer uma tecnologia mais avançada do que ela consegue de fato entregar.

Como a inteligência artificial pode revolucionar a saúde 

Ainda que não tenhamos na prática a medicina futurista dos comerciais da IBM, é inegável que a inteligência das máquinas já está revolucionando o setor.

Recentemente, cientistas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) desenvolveram um sistema capaz de identificar a Covid pelo som da tosse do paciente. Isso foi possível pela aplicação de Big Data somado à Inteligência Artificial. Toda tosse, assim como qualquer barulho, tem um padrão em ondas. Com ajuda das máquinas, cientistas conseguiram gravar as ondas sonoras de vários pacientes e analisar cada uma delas. Será que a tosse de pessoas com Covid tinha subidas e descidas diferentes das tosses de indivíduos saudáveis? A pergunta foi respondida pela IA, que identificou o padrão de ondas sonoras da tosse da Covid e o diferenciou de todos os outros. Quando os pesquisadores alimentaram o sistema com novos registros de tosse, ele identificou com precisão 98,5 por cento das tosses de pessoas confirmadas como tendo Covid-19, incluindo 100 por cento das tosses de assintomáticos – que relataram não apresentar sintomas, mas tiveram resultado positivo para o vírus. O teste foi feito com dezenas de milhares de amostras de tosse, bem como de palavras faladas. É um estudo ainda em fase inicial, mas que parece ser promissor. No momento, a equipe está trabalhando na incorporação do sistema em um aplicativo amigável com potencial para ser adotado em larga escala.

O uso da inteligência artificial para melhorar o atendimento e gestão de saúde foi um dos temas do Summit Saúde Brasil, congresso sobre saúde, tecnologia e inovação realizado pelo jornal O Estado de São Paulo em outubro deste ano. O evento publicou uma lista de possíveis aplicações IA no setor médico que já estão em uso ou teste ao redor do mundo: 

  • Análise de dados para aceleração de diagnóstico: “engenheiros e pesquisadores estão usando o machine learning para reunir dados e desenvolver algoritmos que ajudem médicos a procurar sintomas das doenças”.
  • Rastreamento de casos: “sistema de IA pode ajudar a identificar infectados e possíveis surtos por meio de monitoramento de notícias na internet e publicação nas redes sociais”
  • Análise de exames: “a tecnologia está sendo utilizada para analisar imagens de tomografia e outros exames para detectar com maior eficiência e grau de acerto. Cientistas chineses estão lançando sistemas capazes de diagnosticar covid-19 em segundos com precisão”.
  • Análises preditivas: “a BlueDot, uma startup fundada em resposta à epidemia de Sars, usa linguagem natural para buscar notícias sobre a doenças em pessoas e animais. O sistema conseguiu prever o aumento de altas taxas de pneumonia na China nove dias antes de os números aumentarem”.

IA na saúde brasileira

Em 2018, um software de inteligência artificial começou a ser usado no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, para mapear nódulos pulmonares em exames de rotina e revelar aos médicos quais pacientes têm maior risco de desenvolver câncer de pulmão, um dos tipos de tumor mais letais. Essa foi uma das primeiras utilizações de IA em grande escala no Brasil. 

Umas das maiores healthechs brasileiras em termos de faturamento, a Pixeon utiliza inteligência artificial para entender melhor a jornada dos pacientes e ajudar instituições de saúde a prestarem serviços mais efetivos. Outra grande do setor é a Semantix. A empresa oferece diversas ferramentas de gestão de negócios baseadas em IA, Big Data e Internet das Coisas.

As aplicações são muitas e podem revolucionar muitas áreas da saúde. Pesquisadores brasileiros estão trabalhando, por exemplo, em abordagens de IA em combinação com neurologia. Os estudos focam em linguagem e buscam ajudar pessoas com a capacidade de comunicação limitada por doenças como a esclerose múltipla.

Mudança cultural na saúde

Todo esse cenário é bastante promissor. Na Salvus, nós pensamos na inteligência artificial na saúde não apenas como uma questão de tecnologia, mas de uma revolução cultural. Apenas “instalar um sistema” não é o suficiente. Para pensarmos em tecnologias emergentes, como a IA, atuando na melhoria do atendimento médico, temos que pensar também numa transformação em como enxergamos o bem estar e a qualidade de vida da população. Além de aumentar a eficiência no na tratamento de doenças, a transformação que a tecnologia traz vai nos ajudar a pensar em prevenção, diagnóstico precoce e acompanhamento contínuo. A revolução da saúde já começou. Vamos nessa!

Fontes:

Health Insights

https://healthtransformer.co/startup-health-insights-home-care-and-wearables-close-large-funding-rounds-week-of-nov-4-2020-d4734dd9e870

Universidade de Harvard

http://sitn.hms.harvard.edu/flash/2017/history-artificial-intelligence/

Canal Tech

https://canaltech.com.br/big-data/o-que-e-big-data/

Big Data Framework

MIT

https://news.mit.edu/2020/covid-19-cough-cellphone-detection-1029

Projeto Draft

UOL

https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2021/03/14/pesquisa-brasileira-com-ia-pode-ampliar-acesso-a-deteccao-de-retinopatia.htm

Veja Saúde

https://saude.abril.com.br/blog/com-a-palavra/a-inteligencia-artificial-vai-revolucionar-a-medicina-que-conhecemos/

TecMundo

https://www.tecmundo.com.br/intel/1039-o-que-e-inteligencia-artificial-.htm

Britannica

https://www.britannica.com/technology/DENDRAL

https://www.britannica.com/technology/MYCIN

IBM

https://www.ibm.com/watson

https://www.ibm.com/watson-health

Folha de São Paulo

https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,inteligencia-artificial-sera-usada-para-mapear-risco-de-cancer-de-pulmao,70002300686

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